sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Extinção da empresa e garantias de emprego

Caro colega concurseiro,

A questão dos efeitos da extinção do estabelecimento sobre as garantias provisórias de emprego desafia a doutrina, que apresenta múltiplos entendimentos a respeito. A grande questão posta é saber se devida ou não a indenização pelo tempo restante de “estabilidade”, tendo em vista que, obviamente, a reintegração é, no caso, inviável.

A Profª. Vólia Bomfim assevera que 

“a extinção da empresa, do estabelecimento costuma extinguir todos os tipos de estabilidade, porque este direito visa proibir o empregador de efetivar dispensas imotivadas, o que não ocorre no caso de morte do empregador ou extinção da empresa. Como garantir o emprego cuja empresa não mais existe? Não seria lógico manter uma estabilidade sem emprego. Apesar de majoritário, há entendimentos em contrário que defendem que neste caso (extinção da empresa) o empregado deveria receber em pecúnia a indenização substitutiva da estabilidade”[1]

No mesmo sentido, a Profª. Alice Monteiro de Barros ensina que 

“atualmente predomina no Tribunal Superior do Trabalho o entendimento segundo o qual o contrato de trabalho cessa com o encerramento das atividades empresariais, na forma da Súmula n. 173 desse mesmo Tribunal, que preceitua: ‘Extinto automaticamente o vínculo empregatício, com a cessação das atividades da empresa, os salários só são devidos até a data da extinção’”[2]

Acredito que a melhor solução seja modular estes efeitos da extinção da empresa sobre as garantias provisórias de emprego conforme seja o fim a que se destina a garantia. 

No caso do dirigente sindical, por exemplo, a garantia de emprego tem por objetivo evitar que o empregador pratique qualquer ato anti-sindical, no sentido de embaraçar o regular exercício da representação sindical, por meio de represálias e da constante ameaça de demissão do dirigente.  Assegurado provisoriamente o emprego, portanto, a categoria estará, em tese, tranquila quanto à postura livre e combativa a ser adotada pelo seu representante.  

Desse modo, é claro que a extinção do estabelecimento faz com que a estabilidade perca completamente o sentido. Ora, garantir-se-ia o que?  Se não mais existe o empregador/empresa, que tipo de ato anti-sindical poderia advir desta relação?  O empregador não teria mais nenhum motivo para perturbar o livre exercício da representação sindical pelo empregado eleito dirigente. Logo, não subsiste a garantia de emprego conferida ao dirigente sindical ante a extinção do estabelecimento. E, naturalmente, também não será devida qualquer indenização.  Neste sentido, a interpretação pacífica do TST, por meio da Súmula 369, IV:  

SUM-369 DIRIGENTE SINDICAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 

IV - Havendo extinção da atividade empresarial no âmbito da base territorial do sindicato, não há razão para subsistir a estabilidade.

Da mesma forma, a garantia de emprego conferida ao cipeiro enquadra-se na classificação de “estabilidade comunitária”, e não “personalíssima”, no sentido de que a garantia visa à proteção dos interesses da comunidade de empregados de determinada empresa. 

Com efeito, tal qual ocorre com o dirigente sindical, o representante dos empregados na CIPA é um potencial alvo de represálias do empregador, ao passo que sua atuação combativa (como deve ser) contraria os interesses patronais, normalmente traduzindo-se em maiores custos a fim de assegurar o adequado meio ambiente de trabalho. 

É esta a finalidade da garantia de emprego assegurada ao cipeiro: deixá-lo livre da pressão patronal, de forma que possa exercer plenamente a função para a qual foi eleito pelos seus pares. 

Tal como ocorre com o dirigente sindical, a extinção do estabelecimento fulmina o objeto da garantia de emprego, razão pela qual esta também não subsiste. Igualmente não é devida qualquer indenização.  
Neste sentido, a Súmula 339, item II, do TST:

SUM-339 CIPA. SUPLENTE. GARANTIA DE EMPREGO. CF/1988 - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 

II - A estabilidade provisória do cipeiro não constitui vantagem pessoal, mas garantia para as atividades dos membros da CIPA, que somente tem razão de ser quando em atividade a empresa. Extinto o estabelecimento, não se verifica a despedida arbitrária, sendo impossível a reintegração e indevida a indenização do período estabilitário.

As duas exceções à regra geral (no sentido da cessação dos efeitos da estabilidade provisória em consequência do encerramento das atividades empresariais) parecem ser, para boa parte da doutrina, com reflexos em alguns julgados do TST, as garantias conferidas à gestante e ao acidentado. 

Uma vez mais, transcrevo lição da Profª Alice Monteiro de Barros:

“O mesmo TST, em decisão da 2ª Turma (...), abriu exceção para a gestante, ao argumento de que ‘a garantia visa a não privar a gestante da conservação de um emprego que é vital para o nascituro, já que o salário percebido será utilizado em favor da subsistência e nutrição deste’.
Outra exceção apresentada pelo TST diz respeito ao acidentado. É que, por encontrar-se em fase de recuperação de acidente do trabalho, deve-se-lhe assegurar o direito à garantia provisória, para que possa contar com os proventos necessários à sua subsistência e à de sua família, não obstante o encerramento das atividades empresariais no local”[3].

Em sentido contrário, o Min. Godinho Delgado defende que 

“parece claro, portanto, caber também, regra geral, a correspondente indenização no tocante aos empregados protegidos por estabilidades provisórias, embora se possa afirmar que, sem dúvida, fica prejudicada, no restante, a referida proteção e seu resultado jurídico máximo, a reintegração”[4]

E arremata o ilustre jurista mineiro explicando que 

“A terceira linha de interpretação elimina qualquer repercussão indenizatória quanto à situação em exame, vislumbrando a incidência apenas das verbas da dispensa injusta (aviso-prévio, etc.). Esta vertente, entretanto, conforme já exposto anteriormente neste Curso, não parece consistente com o conjunto da ordem jurídica: ora, se a extinção da atividade resulta do exercício do poder diretivo empresarial (e isso é reconhecido pela jurisprudência: ver, a propósito, a Súmula 44 do TST), o ato potestativo do empregador deveria responder pela frustração de garantias trabalhistas em curso, como ocorre, afinal, em qualquer situação de afronta a direitos e garantias na sociedade contemporânea (art. 159, CCB/1916; arts. 186 e 927, CCB/2002). Ou seja, deveria provocar, pelo menos, a indenização simples pelo período remanescente do mandato obreiro, isto é, o período em que, em virtude do ato unilateral do empregador, se frustou o papel social e representativo do dirigente”[5].

Para fins de concurso público, o mais prudente é sempre seguir o que há de pacífico no âmbito do TST. E, neste diapasão, temos as Súmulas 339, II, e 369, IV, que impõem a cessação da estabilidade do dirigente sindical e do cipeiro, no caso de extinção da empresa. Se a estabilidade perde seu objeto, deduz-se logicamente que, para o TST, cessam seus efeitos, inclusive o direito à indenização compensatória. 

Aliás, em provas de concurso normalmente a matéria é cobrada somente até este ponto, e especificamente explorando a literalidade das súmulas mencionadas. 

Quanto às hipóteses de garantia de emprego da gestante e do acidentado, acredito seja seguro defender, também em uma prova, o cabimento da indenização, por três razões: a) porque o TST não tem entendimento sumulado em sentido contrário; b) porque o TST tem decisões neste mesmo sentido, conforme mencionado; c) porque o raciocínio segue o entendimento do Min. Godinho, cada vez mais prestigiado pelas bancas, sem, contudo, contrariar entendimento predominante no TST.

Valor da indenização:

Vencida a questão do cabimento ou não da indenização, conforme o caso, resta discutir qual seria o valor dessa indenização. 

Muitos confundem as marchas e entendem aplicáveis os artigos 497/498 da CLT (indenização dobrada). Não obstante, os dispositivos em referência aplicam-se somente à antiga indenização celetista, não podendo ser estendidos às garantias provisórias de emprego. Isto porque é princípio comezinho do direito a impossibilidade de interpretação extensiva e/ou de aplicação analógica de regra punitiva. 

Assim, omissa a lei a respeito da indenização cabível in casu, entende-se majoritariamente que seria a indenização simples das verbas contratuais devidas (para uns, até o final do período de estabilidade; para outros, até o final do mandato, quando for este o caso).  

Abraço e bons estudos!



[1] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. – 4ª Ed. – Niterói : Impetus, 2010, p.1125.
[2] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. – 6ª Ed. – São Paulo : LTr, 2010, p. 1001.
[3] BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p. 1001.
[4] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. – 9ª Ed – São Paulo : LTr, 2010, p. 1173.
[5] DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 1174.

Um comentário:

  1. Excelente o seu artigo! Estava há algum tempo procurando sobre este tema em livros e na Internet, e não havia encontrado nada tão claro e bem fundamentado! Meus parabéns!
    Abraço,
    Thallyta

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