quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Prescrição total vs. prescrição parcial - 1ª parte - Súmula 294 do TST


Caro colega concurseiro, 

Como vimos no artigo denominado “contagem do prazo prescricional trabalhista”, a prescrição, no Direito do Trabalho, compreende dois prazos distintos, a saber, a prescrição bienal e a prescrição quinquenal. 

No tocante ao prazo bienal, não há qualquer margem a dúvida: a prescrição bienal é sempre total

Como assim?  

Numa linguagem bem simples, pode-se dizer que, decorridos dois anos da extinção do contrato de trabalho, perde-se tudo!

Com efeito, se o empregado deixou passar dois anos e um dia da extinção do contrato para ajuizar sua reclamação trabalhista, não lhe restará qualquer pretensão. Ele terá perdido todas as parcelas que lhe seriam devidas, dada a incidência da prescrição (total). 

Esta é a ideia da prescrição total, em contraposição à prescrição parcial.  Na prescrição total, perde-se tudo. Na prescrição parcial, perde-se apenas parte. Óbvio, não?!

Se a prescrição bienal é sempre total, a distinção entre prescrição total e parcial somente tem lugar no estudo da prescrição quinquenal. 

E é esta a proposta deste artigo: esclarecer como funciona a prescrição quinquenal parcial e total. 

Exemplos

Caso 1

O empregado sempre laborou no período noturno, mas recebeu o adicional noturno até março/2002, sendo que a partir de abril/2002 a referida parcela (adicional noturno) foi suprimida pelo empregador. 
Considerando os meses mencionados como de recebimento, a primeira lesão se deu em abril/2002.  

Pergunta-se: no caso, aplica-se a prescrição total ou parcial? 

Parcial, que consiste no seguinte: as lesões se renovam mês a mês. A primeira lesão foi em abril/2002, mas também teve uma lesão igual (decorrente do mesmo fato, ou seja, da supressão do adicional) em maio/2002, outra em junho/2002, e assim sucessivamente, até a extinção do contrato de trabalho.  Se a prescrição é parcial quer dizer, então, que a pretensão decorrente da lesão ocorrida em abril/2002 prescreverá em cinco anos (em abril/2007, portanto), e as sucessivas da mesma forma...  

Logo, se o empregado tiver ajuizado a ação, por exemplo, em julho/2010, poderá reclamar a supressão do adicional noturno desde julho/2005, não obstante a primeira lesão tenha ocorrido em momento anterior (abril/2002), e, portanto, há mais de cinco anos.

Caso 2

O empregado recebeu gratificação ajustada no contrato de trabalho até março/2002, sendo que a partir de abril/2002 a referida gratificação foi suprimida pelo empregador. 

Nos termos do art. 468 da CLT são vedadas as alterações contratuais lesivas, razão pela qual o ato do empregador (supressão da gratificação ajustada) é ilícito. 

Pergunta-se: no caso, aplica-se a prescrição total ou parcial?

Total, que consiste no seguinte:  embora em todos os meses subsequentes a abril/2002 aquela gratificação não tenha sido paga, considera-se, para fins de fixação do marco inicial da contagem do prazo prescricional (actio nata), a data da primeira lesão, ou seja, a data da supressão da gratificação. Portanto, em abril/2007 a pretensão do empregado a reclamar a supressão da gratificação ajustada estará totalmente fulminada pela prescrição. 

Logo, se o empregado tiver ajuizado a ação, por exemplo, em julho/2010, não poderá reclamar NADA relativo à supressão da gratificação, pois a pretensão decorrente da lesão já está prescrita desde abril/2007.

Pergunta-se, é claro: e qual é a diferença entre os dois exemplos?

A diferença, que afinal determina a aplicação da prescrição total ou parcial, é o título jurídico que fundamenta e confere validade à parcela discutida. Em outras palavras, é o “lugar” onde está previsto o direito àquela parcela. 

Se a parcela está assegurada por preceito de lei, a prescrição será parcial. 

Se a parcela não está assegurada por preceito de lei, a prescrição será total. 

Cuidado apenas com a amplitude da interpretação de “preceito de lei”. Se considerarmos “lei em sentido amplo”, alcança também as normas coletivas (ACT e CCT). Ao contrário, se considerarmos “lei em sentido estrito” (lei em sentido formal e material),  a regra não alcançaria as normas coletivas.  A tendência, inclusive no TST, é pela interpretação mais ampla, até porque mais benéfica ao trabalhador. 

Assim, se a parcela for assegurada apenas por cláusula contratual ou regulamentar (ou ainda por norma coletiva, para os que defendem a interpretação restrita do termo “preceito de lei”), a prescrição aplicável será a total. 

Neste sentido, a Súmula nº 294 do TST:

SUM-294 PRESCRIÇÃO. ALTERAÇÃO CONTRATUAL. TRABALHADOR URBANO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 

Tratando-se de ação que envolva pedido de prestações sucessivas decorrente de alteração do pactuado, a prescrição é total, exceto quando o direito à parcela esteja também assegurado por preceito de lei.

Só para esclarecer, nos exemplos acima a supressão do adicional noturno se sujeita à prescrição parcial porque a parcela é assegurada por preceito de lei (art. 7º, IX, da CRFB, c/c o art. 73 da CLT), ao passo que a supressão da gratificação se sujeita à prescrição total, porque não há preceito de lei que assegure o pagamento de gratificação, a qual normalmente é ajustada. 

Assim, este artigo trata da distinção básica entre prescrição total e prescrição parcial à luz da Súmula 294 do TST.  Não obstante, em um próximo artigo veremos outros desdobramentos desta questão, à luz do direito comum, de julgados do próprio TST e de questão anterior da FCC. 

Abraço e bons estudos!

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Novíssimas OJs do TST - breves considerações

Caro colega concurseiro, 

O TST publicou, na última sexta-feira, dia 22.10.2010, no DEJT (paginas 02/07), novas Orientações Jurisprudenciais – OJs da SDI-1. São as OJs de nº 406 a 411, disponíveis para consulta em https://aplicacao.jt.jus.br/dejt/diariocon.pub

Dentre estes novos verbetes de jurisprudência, que logo aparecerão nas provas de concursos públicos, destaca-se a OJ nº 410, a qual consagra, de uma vez por todas, o repouso semanal hebdomadário, ou seja, a periodicidade necessariamente semanal do DSR, sob pena de pagamento dobrado. 

Eis o texto da novíssima orientação jurisprudencial: 

410. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. CONCESSÃO APÓS O SÉTIMO DIA CONSECUTIVO DE TRABALHO. ART. 7º, XV, DA CF. VIOLAÇÃO.

Viola o art. 7º, XV, da CF a concessão de repouso semanal remunerado após o sétimo dia consecutivo de trabalho, importando no seu pagamento em dobro.

A questão, que já foi objeto de alguma controvérsia, vinha sendo uniformizada no plano doutrinário. Afinal, o descanso é semanal remunerado. Além disso, a origem do instituto remonta às Sagradas Escrituras, segundo as quais Deus descansou no sétimo dia

Também deve ser bastante explorada em provas de concurso a OJ nº 411: 

411. SUCESSÃO TRABALHISTA. AQUISIÇÃO DE EMPRESA PERTENCENTE A GRUPO ECONÔMICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO SUCESSOR POR DÉBITOS TRABALHISTAS DE EMPRESA NÃO ADQUIRIDA. INEXISTÊNCIA.

O sucessor não responde solidariamente por débitos trabalhistas de empresa não adquirida, integrante do mesmo grupo econômico da empresa sucedida, quando, à época, a empresa devedora direta era solvente ou idônea economicamente, ressalvada a hipótese de má-fé ou fraude na sucessão.

A situação, na prática, é a seguinte:

Imagine-se um grupo econômico formado por três empresas, “A”, “B” e “C”.  Uma quarta empresa (“D”), adquire a empresa “A”. Neste caso, “D” é sucessora de “A”. Os empregados vinculados à empresa “B”, que ao tempo da sucessão de “A” por “D”, era solvente (tinha condição de adimplir os créditos trabalhistas de seus empregados), não poderão reclamar seus créditos, futuramente, de “D”, sob a alegação de que a empresa sucedida (“A”) era solidariamente responsável pelos seus créditos, por integrar grupo econômico. A exceção é a ocorrência de má-fé ou fraude na sucessão.

Abraço e bons estudos!

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Extinção da empresa e garantias de emprego

Caro colega concurseiro,

A questão dos efeitos da extinção do estabelecimento sobre as garantias provisórias de emprego desafia a doutrina, que apresenta múltiplos entendimentos a respeito. A grande questão posta é saber se devida ou não a indenização pelo tempo restante de “estabilidade”, tendo em vista que, obviamente, a reintegração é, no caso, inviável.

A Profª. Vólia Bomfim assevera que 

“a extinção da empresa, do estabelecimento costuma extinguir todos os tipos de estabilidade, porque este direito visa proibir o empregador de efetivar dispensas imotivadas, o que não ocorre no caso de morte do empregador ou extinção da empresa. Como garantir o emprego cuja empresa não mais existe? Não seria lógico manter uma estabilidade sem emprego. Apesar de majoritário, há entendimentos em contrário que defendem que neste caso (extinção da empresa) o empregado deveria receber em pecúnia a indenização substitutiva da estabilidade”[1]

No mesmo sentido, a Profª. Alice Monteiro de Barros ensina que 

“atualmente predomina no Tribunal Superior do Trabalho o entendimento segundo o qual o contrato de trabalho cessa com o encerramento das atividades empresariais, na forma da Súmula n. 173 desse mesmo Tribunal, que preceitua: ‘Extinto automaticamente o vínculo empregatício, com a cessação das atividades da empresa, os salários só são devidos até a data da extinção’”[2]

Acredito que a melhor solução seja modular estes efeitos da extinção da empresa sobre as garantias provisórias de emprego conforme seja o fim a que se destina a garantia. 

No caso do dirigente sindical, por exemplo, a garantia de emprego tem por objetivo evitar que o empregador pratique qualquer ato anti-sindical, no sentido de embaraçar o regular exercício da representação sindical, por meio de represálias e da constante ameaça de demissão do dirigente.  Assegurado provisoriamente o emprego, portanto, a categoria estará, em tese, tranquila quanto à postura livre e combativa a ser adotada pelo seu representante.  

Desse modo, é claro que a extinção do estabelecimento faz com que a estabilidade perca completamente o sentido. Ora, garantir-se-ia o que?  Se não mais existe o empregador/empresa, que tipo de ato anti-sindical poderia advir desta relação?  O empregador não teria mais nenhum motivo para perturbar o livre exercício da representação sindical pelo empregado eleito dirigente. Logo, não subsiste a garantia de emprego conferida ao dirigente sindical ante a extinção do estabelecimento. E, naturalmente, também não será devida qualquer indenização.  Neste sentido, a interpretação pacífica do TST, por meio da Súmula 369, IV:  

SUM-369 DIRIGENTE SINDICAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 

IV - Havendo extinção da atividade empresarial no âmbito da base territorial do sindicato, não há razão para subsistir a estabilidade.

Da mesma forma, a garantia de emprego conferida ao cipeiro enquadra-se na classificação de “estabilidade comunitária”, e não “personalíssima”, no sentido de que a garantia visa à proteção dos interesses da comunidade de empregados de determinada empresa. 

Com efeito, tal qual ocorre com o dirigente sindical, o representante dos empregados na CIPA é um potencial alvo de represálias do empregador, ao passo que sua atuação combativa (como deve ser) contraria os interesses patronais, normalmente traduzindo-se em maiores custos a fim de assegurar o adequado meio ambiente de trabalho. 

É esta a finalidade da garantia de emprego assegurada ao cipeiro: deixá-lo livre da pressão patronal, de forma que possa exercer plenamente a função para a qual foi eleito pelos seus pares. 

Tal como ocorre com o dirigente sindical, a extinção do estabelecimento fulmina o objeto da garantia de emprego, razão pela qual esta também não subsiste. Igualmente não é devida qualquer indenização.  
Neste sentido, a Súmula 339, item II, do TST:

SUM-339 CIPA. SUPLENTE. GARANTIA DE EMPREGO. CF/1988 - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 

II - A estabilidade provisória do cipeiro não constitui vantagem pessoal, mas garantia para as atividades dos membros da CIPA, que somente tem razão de ser quando em atividade a empresa. Extinto o estabelecimento, não se verifica a despedida arbitrária, sendo impossível a reintegração e indevida a indenização do período estabilitário.

As duas exceções à regra geral (no sentido da cessação dos efeitos da estabilidade provisória em consequência do encerramento das atividades empresariais) parecem ser, para boa parte da doutrina, com reflexos em alguns julgados do TST, as garantias conferidas à gestante e ao acidentado. 

Uma vez mais, transcrevo lição da Profª Alice Monteiro de Barros:

“O mesmo TST, em decisão da 2ª Turma (...), abriu exceção para a gestante, ao argumento de que ‘a garantia visa a não privar a gestante da conservação de um emprego que é vital para o nascituro, já que o salário percebido será utilizado em favor da subsistência e nutrição deste’.
Outra exceção apresentada pelo TST diz respeito ao acidentado. É que, por encontrar-se em fase de recuperação de acidente do trabalho, deve-se-lhe assegurar o direito à garantia provisória, para que possa contar com os proventos necessários à sua subsistência e à de sua família, não obstante o encerramento das atividades empresariais no local”[3].

Em sentido contrário, o Min. Godinho Delgado defende que 

“parece claro, portanto, caber também, regra geral, a correspondente indenização no tocante aos empregados protegidos por estabilidades provisórias, embora se possa afirmar que, sem dúvida, fica prejudicada, no restante, a referida proteção e seu resultado jurídico máximo, a reintegração”[4]

E arremata o ilustre jurista mineiro explicando que 

“A terceira linha de interpretação elimina qualquer repercussão indenizatória quanto à situação em exame, vislumbrando a incidência apenas das verbas da dispensa injusta (aviso-prévio, etc.). Esta vertente, entretanto, conforme já exposto anteriormente neste Curso, não parece consistente com o conjunto da ordem jurídica: ora, se a extinção da atividade resulta do exercício do poder diretivo empresarial (e isso é reconhecido pela jurisprudência: ver, a propósito, a Súmula 44 do TST), o ato potestativo do empregador deveria responder pela frustração de garantias trabalhistas em curso, como ocorre, afinal, em qualquer situação de afronta a direitos e garantias na sociedade contemporânea (art. 159, CCB/1916; arts. 186 e 927, CCB/2002). Ou seja, deveria provocar, pelo menos, a indenização simples pelo período remanescente do mandato obreiro, isto é, o período em que, em virtude do ato unilateral do empregador, se frustou o papel social e representativo do dirigente”[5].

Para fins de concurso público, o mais prudente é sempre seguir o que há de pacífico no âmbito do TST. E, neste diapasão, temos as Súmulas 339, II, e 369, IV, que impõem a cessação da estabilidade do dirigente sindical e do cipeiro, no caso de extinção da empresa. Se a estabilidade perde seu objeto, deduz-se logicamente que, para o TST, cessam seus efeitos, inclusive o direito à indenização compensatória. 

Aliás, em provas de concurso normalmente a matéria é cobrada somente até este ponto, e especificamente explorando a literalidade das súmulas mencionadas. 

Quanto às hipóteses de garantia de emprego da gestante e do acidentado, acredito seja seguro defender, também em uma prova, o cabimento da indenização, por três razões: a) porque o TST não tem entendimento sumulado em sentido contrário; b) porque o TST tem decisões neste mesmo sentido, conforme mencionado; c) porque o raciocínio segue o entendimento do Min. Godinho, cada vez mais prestigiado pelas bancas, sem, contudo, contrariar entendimento predominante no TST.

Valor da indenização:

Vencida a questão do cabimento ou não da indenização, conforme o caso, resta discutir qual seria o valor dessa indenização. 

Muitos confundem as marchas e entendem aplicáveis os artigos 497/498 da CLT (indenização dobrada). Não obstante, os dispositivos em referência aplicam-se somente à antiga indenização celetista, não podendo ser estendidos às garantias provisórias de emprego. Isto porque é princípio comezinho do direito a impossibilidade de interpretação extensiva e/ou de aplicação analógica de regra punitiva. 

Assim, omissa a lei a respeito da indenização cabível in casu, entende-se majoritariamente que seria a indenização simples das verbas contratuais devidas (para uns, até o final do período de estabilidade; para outros, até o final do mandato, quando for este o caso).  

Abraço e bons estudos!



[1] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. – 4ª Ed. – Niterói : Impetus, 2010, p.1125.
[2] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. – 6ª Ed. – São Paulo : LTr, 2010, p. 1001.
[3] BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p. 1001.
[4] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. – 9ª Ed – São Paulo : LTr, 2010, p. 1173.
[5] DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 1174.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Análise da Súmula 331 do TST (texto atualizado cf. Res. 174/2011 TST)

Caro colega concurseiro,

O artigo de hoje é sobre a construção jurisprudencial acerca dos efeitos da terceirização no âmbito trabalhista.

Com efeito, a terceirização é fenômeno estranho, em princípio, ao Direito do Trabalho, tendo surgido na seara da Ciência da Administração, como forma de “transferência de atividades para fornecedores especializados, detentores de tecnologia própria e moderna, que tenham esta atividade terceirizada como sua atividade-fim, liberando a tomadora para concentrar seus esforços gerenciais em seu negócio principal, preservando e evoluindo em qualidade e produtividade, reduzindo custos e gerando competitividade”[1].

Em que pese não seja instituto próprio do direito laboral, certamente a terceirização produz efeitos relevantes (e devastadores) na relação típica empregatícia, ao passo que acrescenta, na relação de emprego, uma terceira pessoa (empresa prestadora de serviços), que muitas vezes não tem qualquer idoneidade econômico-financeira para garantir os créditos trabalhistas de seus empregados.

A fim de modular tais efeitos, a jurisprudência trabalhista, e mais especificamente o TST, construiu um modelo a ser seguido em matéria de terceirização e seus efeitos na seara laboral. Atualmente tal modelo está praticamente concentrado na Súmula 331 do TST, que serve de referência para solução da questão. 

Exatamente por isso o referido verbete é lugar-comum nas provas de concursos.  Tenha em mente que você precisa memorizar estes quatro itens da Súmula 331, até porque a grande maioria das questões explora sua literalidade.

A proposta deste artigo é analisar pormenorizadamente a Súmula 331. Vejamos:

SUM-331 CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

Item I

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

O item I esclarece que é vedada a intermediação de mão-de-obra no sistema jurídico brasileiro, salvo em uma única hipótese, que é o trabalho temporário.

Com efeito, “contratação de trabalhadores por empresa interposta” é o mesmo que contratar trabalhadores por intermédio de uma terceira empresa, que “os aluga” então ao tomador. Trata-se de coisificação do trabalho humano, e como tal é repugnado pelo direito (princípio da não-mercantilização do trabalho).

Assim, o item I da Súmula 331 define a intermediação de mão-de-obra como sendo, em regra, hipótese de terceirização ilícita. Uma vez mais, a única exceção é o trabalho temporário.

Qual o efeito da terceirização ilícita, neste caso?

Simples: afasta-se a forma, deixando transparecer a realidade (art. 9º da CLT), ou seja, o vínculo de emprego se forma entre o empregado e o tomador dos serviços (vínculo direto). Aqui não há se falar, em princípio, em responsabilidade solidária ou subsidiária. A responsabilidade é direta, única e exclusiva do tomador, que a rigor é o real empregador.

Entretanto, tem ganhado força na doutrina a tese no sentido de que, nesta hipótese de terceirização ilícita, o tomador de serviços continua sendo o responsável direto, nos termos do item I, mas a empresa prestadora de serviços (terceiro) seria responsável solidária, ao passo que a ninguém é dado alegar a própria torpeza em benefício próprio. Assim, se o terceiro se obrigou voluntariamente, em flagrante fraude à lei, também deve suportar os efeitos da condenação.


Item II

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou  fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

Aqui a questão não é trabalhista, mas constitucional. Apesar da intermediação de mão-de-obra não ser tolerada pelo sistema jurídico, como estudado, no caso da administração pública a contratação pressupõe forma solene, qual seja, aprovação em concurso público, conforme art. 37, II, da CRFB:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...) omissis

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

Assim, ainda que a contratação tenha sido irregular, não poderá gerar vínculo de emprego com a administração, pois foi realizada sem o devido concurso. A questão da responsabilização será estudada no capítulo seguinte.

Item III

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

Se no item I nós temos o regramento da terceirização considerada ilícita, aqui, no III, temos a regra de terceirização lícita. Com efeito, a jurisprudência admite três modalidades de terceirização, a saber:

a)      Serviços de vigilância, regulados pela Lei nº 7.102/1983, conforme visto;
b)      Serviços de conservação e limpeza
c)      Serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador

Aqui é importante traçar a distinção entre atividade-fim e atividade-meio. Não obstante grandes controvérsias doutrinárias a respeito, a tendência é considerar como atividade-fim aquela ligada indissociavelmente ao objeto social da empresa, ou seja, aquela sem a qual a empresa não realiza seu objetivo, sua atividade principal.

Exemplo: caixa bancário.  Desempenha, sem nenhuma dúvida, atividade-fim do banco, pois se ativa diretamente na atividade central da empresa, pelo que é indispensável na dinâmica empresarial. Logo, a atividade de caixa bancário jamais poderá ser terceirizada.

Atividade-meio, por sua vez, seria aquela atividade de apoio, importante mas não essencial para a consecução dos fins do empreendimento. Conservação e limpeza são exemplos clássicos de atividades-meio, e por isso mesmo constam expressamente no item II da Súmula 331 como passíveis de terceirização.

Nestes casos, a parte final do item é meio óbvia, mas ao mesmo tempo esclarecedora: “desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta”.  Claro que a expressão vale para as três hipóteses (vigilância, conservação e limpeza, e atividades-meio).

Isso porque os serviços são não-eventuais (se é uma atividade na empresa, não é uma atividade eventual, e sim uma atividade de apoio, mas necessária ao empreendimento) e onerosos. Logo, se também forem pessoais e subordinados, estarão preenchidos os requisitos caracterizadores da relação de emprego constantes do art. 3º da CLT, e aí teremos, incontestavelmente, a relação de emprego direta com o tomador.

Logo, somente podemos falar em terceirização lícita de atividades de vigilância, conservação e limpeza, e serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, e desde que tais serviços sejam prestados dentro da filosofia da terceirização, qual seja, oferecidos como uma atividade pelo terceiro, e não como mera colocação de trabalhadores, com pessoalidade e subordinação em relação ao tomador.

Por esta razão o trabalho temporário ficou isolado no item I, pois é a única hipótese de “terceirização” em que se admite a pessoalidade e a subordinação diretas com o tomador, tendo em vista que o trabalhador temporário assume um posto direto do tomador, subordinando-se, portanto, a este.

Item IV[1]

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

Este item trata da responsabilização do tomador de serviços nos casos de terceirização. A responsabilidade do tomador dos serviços, nos casos de terceirização lícita, é subsidiária.  Mas tem uma condição: o responsável subsidiário tem que ter participado da relação processual, constando do título executivo judicial.

Muito cuidado para não confundir este pormenor processual com a questão do grupo econômico. Com efeito, atualmente a tendência jurisprudencial é no sentido da irrelevância da participação das demais empresas do grupo econômico na relação processual para fins de responsabilização.  No caso de terceirização é diferente: o tomador dos serviços tem que ter participado da relação processual e também tem que constar do título executivo judicial.

Ora, mas alguém há de perguntar: se a terceirização é lícita, por que o tomador dos serviços também responde? 

Porque, no caso, abusa do direito de terceirizar. Ao eleger mal (culpa in eligendo) seu prestador de serviços, e ao não fiscalizar a conduta do mesmo em relação ao cumprimento das obrigações trabalhistas (culpa in vigilando), o tomador dos serviços age em flagrante abuso de direito, razão pela qual lhe cabe também algum tipo de responsabilidade. 

Há que se mencionar ainda, como justificativa para a responsabilização subsidiária do tomador dos serviços na terceirização, o princípio da despersonalização do empregador, o qual emana da redação funcional do art. 2º da CLT, que considera empregador a “empresa” e não o “empresário”. 

Ainda na hipótese de terceirização lícita há uma situação interessante, que é a do trabalho temporário. Com efeito, a Lei nº 6.019/1974 prevê a hipótese de responsabilização solidária da empresa tomadora dos serviços de trabalho temporário no caso de falência da empresa de trabalho temporário

Art. 16 - No caso de falência da empresa de trabalho temporário, a empresa tomadora ou cliente é solidariamente responsável pelo recolhimento das contribuições previdenciárias, no tocante ao tempo em que o trabalhador esteve sob suas ordens, assim como em referência ao mesmo período, pela remuneração e indenização previstas nesta Lei.

Não obstante, a doutrina tende a considerar a responsabilidade definida pelo item IV da Súmula 331 como extensiva a todas as formas de terceirização, inclusive o trabalho temporário. Assim, teríamos o seguinte: a responsabilidade do tomador é subsidiária no caso de trabalho temporário, exceto no caso de falência da empresa de trabalho temporário, hipótese em que se aplica a responsabilidade solidária. Esta é a posição de parte considerável da doutrina, sendo um de seus defensores MGD. Para concursos, entretanto, acredito que dificilmente a questão seria cobrada com toda esta profundidade. É comum em provas de concurso a menção à responsabilidade da empresa de trabalho temporário no caso de falência, ou seja, responsabilidade solidária.

Item V

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

A fim de afastar a antiga controvérsia acerca da aplicabilidade ou não da responsabilização subsidiária da Administração Pública nas hipóteses de terceirização, o TST acrescentou, através da Resolução nº 174/2011, o item V à Súmula 331. O referido item esclarece, em consonância com o entendimento do STF, que a responsabilização da Administração não é automática, mas pode ocorrer, dependendo da evidência de culpa in vigilando da Administração.

Assim, apenas no caso concreto será possível estabelecer ou não a responsabilização da Administração Pública.


Item VI

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

Outro item acrescentado pela Resolução nº 174/2011, esclarece antiga controvérsia acerca do alcance da responsabilização subsidiária do tomador de serviços. Com efeito, durante muito tempo os tomadores de serviços condenados subsidiariamente em hipótese de terceirização, nos termos da Súmula 331, argumentaram que sua responsabilidade seria limitada ao crédito trabalhista principal, não abrangendo, por exemplo, a multa do art. 477 da CLT. Através deste item VI o TST derrubou qualquer interpretação neste sentido, esclarecendo que todas e quaisquer verbas decorrentes da condenação, logicamente referentes ao período da prestação laboral àquele tomador, são de sua responsabilidade. 

Abraço e bons estudos!


[1] Itens IV a VI editados em 30.06.2011.


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(texto original do artigo - parte alterada em 30.06.2011)

Item IV

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).

Este item trata da responsabilização do tomador de serviços nos casos de terceirização. A responsabilidade do tomador dos serviços, nos casos de terceirização lícita, é subsidiária.  Isso vale também para a Administração Pública. Mas tem uma condição: o responsável subsidiário tem que ter participado da relação processual, constando do título executivo judicial.

Muito cuidado para não confundir este pormenor processual com a questão do grupo econômico. Com efeito, atualmente a tendência jurisprudencial é no sentido da irrelevância da participação das demais empresas do grupo econômico na relação processual para fins de responsabilização.  No caso de terceirização é diferente: o tomador dos serviços tem que ter participado da relação processual e também tem que constar do título executivo judicial.

Ora, mas alguém há de perguntar: se a terceirização é lícita, por que o tomador dos serviços também responde?

Porque, no caso, abusa do direito de terceirizar. Ao eleger mal (culpa in eligendo) seu prestador de serviços, e ao não fiscalizar a conduta do mesmo em relação ao cumprimento das obrigações trabalhistas (culpa in vigilando), o tomador dos serviços age em flagrante abuso de direito, razão pela qual lhe cabe também algum tipo de responsabilidade.

Há que se mencionar ainda, como justificativa para a responsabilização subsidiária do tomador dos serviços na terceirização, o princípio da despersonalização do empregador, o qual emana da redação funcional do art. 2º da CLT, que considera empregador a “empresa” e não o “empresário”.

Ainda na hipótese de terceirização lícita há uma situação interessante, que é a do trabalho temporário. Com efeito, a Lei nº 6.019/1974 prevê a hipótese de responsabilização solidária da empresa tomadora dos serviços de trabalho temporário no caso de falência da empresa de trabalho temporário:

Art. 16 - No caso de falência da empresa de trabalho temporário, a empresa tomadora ou cliente é solidariamente responsável pelo recolhimento das contribuições previdenciárias, no tocante ao tempo em que o trabalhador esteve sob suas ordens, assim como em referência ao mesmo período, pela remuneração e indenização previstas nesta Lei.

Não obstante, a doutrina tende a considerar a responsabilidade definida pelo item IV da Súmula 331 como extensiva a todas as formas de terceirização, inclusive o trabalho temporário. Assim, teríamos o seguinte: a responsabilidade do tomador é subsidiária no caso de trabalho temporário, exceto no caso de falência da empresa de trabalho temporário, hipótese em que se aplica a responsabilidade solidária. Esta é a posição de parte considerável da doutrina, sendo um de seus defensores MGD. Para concursos, entretanto, acredito que dificilmente a questão seria cobrada com toda esta profundidade. É comum em provas de concurso a menção à responsabilidade da empresa de trabalho temporário no caso de falência, ou seja, responsabilidade solidária.

(Ir)responsabilidade da Administração Pública?

Ainda sobre a questão da responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços no caso de terceirização lícita, cabe analisar a questão da responsabilização da Administração Pública.

Com efeito, o Governador do Distrito Federal ajuizou a ADC nº 16/2007, no sentido de que fosse declarada a constitucionalidade do art. 71, §1º, da Lei nº 8.666/1993, e, consequentemente, afastada a responsabilização subsidiária da Administração Pública.

A partir daí, o STF anulou algumas decisões do TST que aplicavam o item IV da Súmula 331, sob o argumento de que antes deveria ser arguida a inconstitucionalidade do supramencionado art. 71, §1º, da Lei de Licitações, em homenagem ao princípio da reserva de plenário, nos termos da súmula vinculante nº 10.

Vejamos:
Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.

§1º A inadimplência do contratado com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.


SV 10 - Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.

Ocorre que a ADC 16/2007 ainda se encontra pendente de julgamento, e a liminar foi negada. Logo, continua plenamente aplicável também à Administração Pública o item IV da Súmula 331.

Neste sentido, notícia recente do TST:

“19/10/2009

TST rejeita recurso com base em decisão do STF sobre constitucionalidade da Súmula 331

Por unanimidade de votos, os ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitaram agravo de instrumento da União que pretendia reformar decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), que a condenou a responder subsidiariamente pelos créditos trabalhistas de empregados terceirizados.

O relator e presidente da Turma, ministro Horácio Senna Pires, concluiu que não havia inconstitucionalidade, como alegado pela União, na decisão do TRT de aplicar à hipótese a Súmula 331, IV, do TST, e, por consequência, negar seguimento ao seu recurso de revista. A súmula trata, justamente, da responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quando há inadimplência das obrigações trabalhistas pela empresa contratada.

No caso, a empresa Officio Serviços de Vigilância e Segurança Ltda. foi contratada para fornecer mão de obra à Receita Federal e não quitou todas os débitos trabalhistas com os empregados. Com o descumprimento das obrigações pela empresa, a Justiça do Trabalho responsabilizou também a União pelo pagamento das dívidas.

A União sustentou no agravo que a Súmula 331/TST violava o artigo 97 da Constituição Federal, que prevê a necessidade de as decisões dos tribunais sobre declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público serem tomadas com o voto da maioria absoluta de seus integrantes (também chamado de reserva de plenário), e ainda foi objeto da Súmula vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal.

No entanto, o ministro Horácio destacou que essa discussão já foi superada na Corte máxima do País. Segundo o relator, recentemente o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, recusou argumento de inconstitucionalidade da Súmula nº 331 do TST, pois ela resultou de votação unânime do Tribunal Pleno, em julgamento de Incidente de Uniformização de Jurisprudência. Portanto, cumprida estava a exigência constitucional da reserva de plenário. (AIRR- 3138/2006-085-02-40.8)”






[1] SILVA, Ciro Pereira da. A Terceirização Responsável: Modernidade e Modismo. São Paulo : LTr, 1997, p. 30.