Caro colega concurseiro,
Uma grande dúvida dos candidatos acerca da sistematização da preparação para concursos públicos diz respeito a “como estudar jurisprudência” para concursos.
Tratarei neste artigo apenas do estudo da jurisprudência trabalhista, embora algumas das considerações possam ser úteis também para o estudo de outros ramos do direito.
A primeira questão que surge para o candidato é “quando estudar jurisprudência”. A resposta só pode ser uma: sempre! E não se argumente que o edital do concurso deveria expressamente incluir no conteúdo programático as súmulas e OJs do TST, pois não faz o menor sentido. O edital tem que especificar os tópicos que serão cobrados, dentro dos quais o candidato precisa saber simplesmente tudo, ou seja, lei, doutrina e jurisprudência.
Se assim não fosse a banca examinadora deveria incluir no edital, também, doutrina, a fim de que pudesse cobrar qualquer conhecimento que extrapolasse a literalidade da lei. Como se vê, o argumento não se sustenta. É verdade que em alguns concursos o conteúdo programático constante do edital especifica os verbetes a estudar (como acontecia até 2006, por exemplo, no concurso para AFT), mas isso não se dá porque a banca precisa desse expediente para cobrar jurisprudência, e sim porque se pretendeu restringir a matéria a ser estudada, assim como ocorre em alguns concursos em que são especificados os dispositivos legais (artigo por artigo) que podem ser objeto de cobrança.
Na prática deparamos, cada vez mais, com um número maior de questões de concurso baseadas na jurisprudência do TST, pelo que é fundamental dominá-la.
A segunda questão que se coloca é “o que estudar”.
Para a imensa maioria dos concursos da área trabalhista o candidato deve conhecer as Súmulas do TST e as Orientações Jurisprudenciais – OJs da SDI-1 do TST. Se o concurso para o qual você se prepara aprofunda nos tópicos de Direito Coletivo do Trabalho, é prudente conhecer também as OJs da SDC do TST. Fique claro, desde já, que estou tratando apenas do estudo do direito material.
OJs da SDI-2 normalmente tratam de assuntos ligados à temática processual. Precedentes normativos e OJs transitórias não costumam ser cobrados em concursos, felizmente.
No tocante às Súmulas e OJs da SDI-1 (e SDC, conforme o caso), em tese você deve conhecer todas. As questões de concurso normalmente exploram a literalidade dos verbetes, pelo que é importante o esforço de memorização. Para separação do material de estudo, sugiro os seguintes passos:
1º) A partir da home page do TST, baixe o “Livro de Súmulas, Orientações Jurisprudenciais e Precedentes Normativos”. Com este arquivo você terá todos os verbetes de jurisprudência do TST, e, melhor, devidamente atualizados. O endereço é http://www.tst.gov.br/jurisprudencia/Index_Enunciados.html
2º) O próximo passo seria separar todos aqueles verbetes já cancelados, os quais obviamente você não precisa estudar/memorizar.
3º) Separar os verbetes por assunto, conforme os tópicos do edital, facilita o estudo, na minha opinião.
4º) Embora em tese você tenha que conhecer todos os verbetes, há alguns cuja cobrança em concurso é pouco provável, pelo que cabe aqui uma hipótese de estratégia de estudo seletivo. Eu não estudaria, por exemplo, a Súmula 54, não obstante ela não tenha sido cancelada. Isso porque esta súmula trata do estável decenal que, como sabemos, é figura em extinção desde a CRFB/88, razão pela qual as bancas examinadoras não teriam qualquer motivo para cobrar este tipo de conhecimento em prova de concurso público nos dias de hoje. Da mesma forma, verbetes que tratam de atualização monetária ou ainda de regras de transição em face de determinada lei nova não são, a priori, boas apostas para uma questão de prova.
A propósito, no meu livro, que está em fase final de redação/revisão, eu menciono os verbetes que reputo devam ser estudados, em relação a cada capítulo.
Separado o material de estudo, surge a terceira questão: “como estudar?”.
Não há como fugir do óbvio: o estudo da jurisprudência passa pela memorização dos verbetes, e não há como se furtar a isso. Entretanto, é sempre mais fácil memorizar aquilo que você entende e, principalmente, aquilo que você consegue associar a outra figura conhecida. Assim, faz-se importante estudar os verbetes de forma contextualizada, no âmbito do seu programa de estudos.
O que quero dizer é que a melhor forma de estudar a jurisprudência é mesclar o estudo dos dispositivos legais e dos verbetes de jurisprudência correspondentes aos pontos do programa, e subsidiariamente utilizar a doutrina para esclarecer os pontos obscuros e facilitar o trabalho de associação com outras figuras conhecidas e/ou exemplos. É esta a premissa que estrutura a redação do meu livro, inclusive.
Muitas vezes os verbetes são difíceis de entender, e aqui cabe, na minha opinião, o ponto mais importante deste artigo: nem sempre um determinado verbete esgota o respectivo assunto!
É imprescindível ter em mente que os verbetes de jurisprudência, e notadamente as Orientações Jurisprudenciais – OJs do TST, têm origem em uma série de decisões judiciais no mesmo sentido. Mas nem sempre estas decisões são abrangentes em relação a determinado assunto, pelo contrário. Muitas vezes um único aspecto de uma questão jurídica chegou à Justiça do Trabalho milhares de vezes, devido a ações dos empregados de uma mesma empresa, e pelo julgamento reiterado em certo sentido, acabou virando OJ e, posteriormente, Súmula. Para facilitar o entendimento, vejamos alguns exemplos:
SUM-85 COMPENSAÇÃO DE JORNADA - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
I. A compensação de jornada de trabalho deve ser ajustada por acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva.
II. O acordo individual para compensação de horas é válido, salvo se houver norma coletiva em sentido contrário.
III. O mero não-atendimento das exigências legais para a compensação de jornada, inclusive quando encetada mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária, se não dilatada a jornada máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional.
IV. A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesta hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional por trabalho extraordinário.
Aparentemente a Súmula 85 trata da compensação de jornada como um todo. Seguindo esta linha de raciocínio, os itens I e II desta súmula autorizariam o estabelecimento do regime de compensação denominado “banco de horas” mediante um simples acordo individual. Não é este, entretanto, o entendimento do TST. Com efeito, em inúmeros julgados recentes o TST tem entendido que a Súmula 85 trata apenas da compensação semanal, e não do “banco de horas”, que exige previsão em norma coletiva. Mas a súmula não menciona isso em nenhum momento.
Portanto, nem sempre o que está escrito no verbete de jurisprudência é o que parece ser. Por um lado, você precisa saber a literalidade do verbete, porque se o mesmo for transcrito numa questão da sua prova, naturalmente você deverá marcar aquela assertiva como correta. Porém, é importante saber estes detalhes porque a banca examinadora pode resolver inovar e testar o candidato além da literalidade.
Outro exemplo é a OJ 44 da SDI-1 do TST:
OJ-SDI1-44 GESTANTE. SALÁRIO MATERNIDADE (inserida em 13.09.1994)
É devido o salário maternidade, de 120 dias, desde a promulgação da CF/1988, ficando a cargo do empregador o pagamento do período acrescido pela Carta.
Certamente você estudou que o salário-maternidade é um benefício previdenciário, e que como tal é devido pelo INSS, embora o pagamento seja antecipado pelo empregador, que posteriormente compensa os valores pagos com as contribuições sociais devidas. E a OJ parece contrariar isso, não é verdade?
Ocorre que um benefício previdenciário não pode ser instituído sem a respectiva fonte de custeio, nos termos do art. 195, §5º, da CRFB. Por isso, o salário-maternidade somente passou a ser devido pela Previdência Social a partir de julho de 1991, quando foi prevista a respectiva fonte de custeio (Leis 8212/1991 e 8213/1991), de forma que no período de outubro de 1988 a julho de 1991 a conta foi para o empregador. Aí a razão da OJ 44.
Desse modo, é sempre importante estudar os verbetes de jurisprudência de forma sistemática, integrada a todas as fontes de estudo escolhidas.
Por fim, uma última consideração: e a jurisprudência não sumulada, deve ser conhecida?
A resposta é diferente dependendo do concurso em questão. Se você for estudar para concursos para Analista ou Técnico dos Tribunais Regionais do Trabalho, a resposta é negativa. Muito dificilmente a banca examinadora cobrará algo de jurisprudência além dos verbetes do TST. Acredito que o mesmo se aplica também aos concursos de Procuradorias (estaduais e municipais), AGU, MPU, etc.
Se, ao contrário, você está se preparando para as carreiras trabalhistas (Magistratura do Trabalho e Ministério Público do Trabalho), a questão muda completamente de figura, e você terá que conhecer o entendimento do TST, mesmo não sumulado, em relação a todas as questões importantes do Direito do Trabalho.
Num meio termo, os candidatos ao concurso para Auditor-Fiscal do Trabalho devem colocar as barbas de molho. Até 2006, a ESAF listava algumas Súmulas no edital, pelo que só podia exigir que o candidato conhecesse aquelas. A partir do concurso de 2009/2010, acabou a listagem no edital. Além disso, nos pareceres utilizados como fundamento para o julgamento dos recursos interpostos em face do gabarito preliminar, divulgados pela ESAF, mencionam-se entendimentos não sumulados do TST. Em razão disso, o candidato que se prepara para o próximo concurso deve ficar atento para o entendimento do TST em questões nevrálgicas, o qual, diga-se de passagem, tem mudado recentemente em vários casos. Exatamente por isso eu sempre escrevo artigos explorando a jurisprudência recente do TST, pois acredito esteja aí o próximo passo das bancas examinadoras.
Abraço e bons estudos!
Ricardo Resende
ricardoresendeprof@gmail.com
Parabéns, Professor!! Um ótimo artigo!!
ResponderExcluirProfessor, além de baixar o livro com todos os verbetes e OJ's pelo site do TST, gostaria de saber que doutrina o Sr. indica para efeito de concurso para analista judiciário do TRT em relação às Súmulas e OJ's do TST comentadas.
Obrigada.
Oi, Aline!
ResponderExcluirObrigado pelas considerações!
Não tenho nenhum livro específico de Súmulas comentadas ou OJs comentadas para indicar. Nunca li nenhum que me convencesse.
Se puder esperar o meu livro, acredito que ele resolverá boa parte dos problemas nesta seara... ;)
Abraço e bons estudos!
Mestre! Excelente Artigo....aguardo seu livro pra reforçar a minha biblioteca!!
ResponderExcluirObrigado, Vagner!
ResponderExcluirEstou trabalhando arduamente para que o livro supere as expectativas.
Abraço e bons estudos!
Prof. Ricardo,
ResponderExcluirLendo seus comentários sobre o que estudar de jurisprudência, pergunto-lhe:para concurso de analista judiciário do TRT, devo estudar súmulas do STF e STJ, pertinentes à outras matérias que não direito do trabalho e processo do trabalho? Não tenho vivência se estas súmulas são cobradas(exceto as vinculantes do stf)em matérias outras como proc. civil,civil,etc.nas bancas FCC e Cespe.
Muito Grata,
Milena Carvalho.